Diferenças entre Tutela antecipada e Liminar
É comum vermos, até mesmo na prática forense, a
confusão técnica entre tutela antecipada e liminar. Isto porque,
ao menos inicialmente, a diferença entre os dois conceitos é muito tênue.
Mas, afinal, qual é a diferença?
Muitas vezes nos é dito, pura e simplesmente, que a distinção entre este e aquele conceito reside no fato de que um necessita de
mais requisitos do que o outro. Contudo, a referida análise não é de todo
acertada, como veremos a seguir.
Ao propor uma demanda, o Autor busca o quê? Pense.
Aquele que se socorre ao Judiciário busca a TUTELA
JURISDICIONAL, isto é, o “remédio”, a proteção do estado em determinado
assunto.
E qual é o momento em que a tutela é, efetivamente,
prestada? Com a sentença, ou melhor, com o trânsito em julgado desta.
Em alguns casos é possível que a tutela, a qual se
pleiteia, seja dada antes da sentença, se preenchidos alguns requisitos,
surgindo aí, o instituto da TUTELA ANTECIPADA.
Importante é salientar que, a partir do preenchimento
dos requisitos, a tutela antecipada pode ser requerida a qualquer momento no
processo, um ponto diferente da liminar, que somente é deferida de imediato,
antes mesmo da abertura do contraditório.
Voltemos. Os requisitos da tutela antecipada estão estampados
no art. 273 do CPC, quais sejam:
a) requerimento da parte – porque o magistrado não
concede a antecipação da tutela ex officio;
b) prova inequívoca – aquela prova que não é equívoca,
nem contraditória;
c) verossimilhança das alegações – do conjunto
probatório dos autos, tem-se, juntamente com as informações contidas no
petitório, que as afirmativas do requerente são verossímeis, aproximam-se de
serem verdadeiras;
+ d) fundado
receio de dano irreparável ou de difícil reparação – ineficácia de um
provimento tardio, isto é, que a prestação da tutela depois de determinado
momento, é ineficaz, porque não mais atende a necessidade da parte;
Ou + d) fique caracterizado o abuso de direito de defesa
ou o manifesto propósito protelatório do réu – aqui é importante mencionar que
o propósito protelatório pode ser tanto do autor quanto do réu; no caso de
mostrar-se clarividente a vontade de uma das partes em postergar determinada
ordem, pode a outra requerer a antecipação de tutela.
Vamos exemplificar a tutela antecipada:
Suponhamos que Sr. José ingresse com ação na qual
pleiteie a tutela jurisdicional a fim de lhe ser realizada cirurgia ocular, uma
vez que não possui condições de pagar pelo procedimento e nem mesmo de aguardar
programa em rede pública, dado o perigo iminente de vir a ficar cego. Veja-se
que, necessariamente, o advogado, ao ingressar com o petitório irá instruí-lo
com laudos médicos, exames, indicação de procedimento cirúrgico, etc.
Diante deste caso hipotético, teremos preenchidos todos
os requisitos do caput do art. 273
conjugado com o inciso I. Nesse caso, com certeza o autor fará pedido de tutela
satisfativa antecipada, isto é, satisfazer a pretensão posta em juízo antes de
chegado o momento do trânsito em julgado. Veja que caso o provimento seja
tardio, o Sr. José poderá ter sofrer um dano irreparável (cegueira).
Caso a referida
tutela antecipada seja dada antes mesmo da abertura do contraditório, isto é,
da contestação pela parte demandada, teremos uma liminar.
Neste ponto reside
a principal diferença. A liminar é dada sempre antes de aberto o contraditório.
No rol dos pedidos, quando o advogado utiliza-se da expressão “requer seja
concedida a tutela antecipada em caráter liminar”, demonstra domínio técnico e
entendimento dos institutos. É como se a tutela fosse um substantivo e o
caráter liminar o adjetivo.
Em ações previdenciárias é muito comum o juiz conceder à
parte autora a tutela antecipada no curso do processo, após realização de
perícia por profissional nomeado pelo juízo. Não se chegou a sentença, mas o
magistrado, diante do requerimento da parte, visualizou os requisitos do art.
273 do CPC de forma mais clara.
De outro norte, a liminar também é vista como medida
cautelar, tendo em vista o local onde se introduz no Código de Processo Civil:
Livro III – Do Processo Cautelar.
Vejamos o que diz o art. 804 do repositório processual
civilista:
Art. 804. É lícito ao juiz conceder liminarmente ou após justificação prévia a
medida cautelar, sem ouvir o réu,
quando verificar que este, sendo citado, poderá torná-la ineficaz; caso em que
poderá determinar que o requerente preste caução real ou fidejussória de
ressarcir os danos que o requerido possa vir a sofrer.
(negritado)
Neste artigo, vemos que a liminar é conferida ao
requerente sem a oitiva do requerido, o que se denomina “liminar inaudita altera parte”.
Isto porque LIMINAR, do latim ab initio, isto é, do início, no começo, é conferida à parte antes
da abertura do contraditório, como já alhures mencionado.
Para o deferimento da liminar, são necessários apenas
dois requisitos: fumus boni iures (fumaça
do bom direito) e periculum in mora (perigo
da demora).
Vejamos:
Art. 798. Além dos procedimentos
cautelares específicos, que este Código regula no Capítulo II deste livro,
poderá o juiz determinar as medidas provisórias que julgar adequadas, quando houver fundado receio de que uma
parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão grave e de
difícil reparação. (negritado)
Neste
artigo vemos o perigo do provimento tardio. Voltando ao exemplo citado acima,
adiantaria se, depois de ficar cego, o provimento jurisdicional concedesse ao
Sr. José a cirurgia, sabendo ser a cegueira irreversível?
Até
aqui entendemos o perigo da demora, e quanto a tal “fumaça do bom direito”?
Entendemos
que o fumus boni iures é a conjugação
da verossimilhança das alegações com a prova inequívoca. Somando estes dois
conceitos, o magistrado consegue enxergar a fumaça do direito daquele que se
socorre ao Juízo.
Postas
estas informações, vamos sintetizar:
TUTELA ANTECIPADA
|
LIMINAR
|
Concedida
a partir do preenchimento dos requisitos do art. 273 com inc. I ou com inc.
II, em qualquer momento processual, desde que após o contraditório.
|
Concedida
quando presentes a fumaça do bom direito e o perigo da demora, antes da abertura do contraditório;
|
A
título de curiosidade, as ações possessórias de força nova admitem liminar,
isto é, a reintegração de posse, por exemplo, pode ser concedida à parte antes
da oitiva do invasor.
Diferente
é a ação de força velha, ou seja, que conta com mais de ano e dia. Neste caso,
não é possível a liminar porque o proprietário que esperou mais de um ano para
ingressar em juízo não tem (ao menos em tese) tanta urgência em ser reintegrado
em sua posse. Mas é possível obter a antecipação de tutela.
Portanto,
a liminar significa o pleito de uma medida de extrema urgência e, mais que
isso, é concedida antes da abertura do contraditório e demanda menos requisitos
a serem preenchidos para sua concessão.
Dúvidas? Pergunte-nos.
Gostei muito da explicação, mas entendo que a medida liminar é usada também em casos que não se referem especificamente à antecipação da pretensão jurídica. Explico. Há casos em que pede-se a liminar para requerer de imediato um direito ferido, mas não pleiteado diretamente na demanda. Exemplo disso é quando o mérito se trata de rescisão de um contrato e a liminar é para exclusão do nome do SPC antes que seja decidido o processo.
ResponderExcluirÍa fazer esta colocação.
ExcluirResumo nada. Uma verdadeira aula muito conceitual e pragmática.
ResponderExcluirEXCELENTE, PRATICO OBJETIVO E ESCLARECEDOR PARABÉNS!
ResponderExcluirEXCELENTE, PRATICO OBJETIVO E ESCLARECEDOR PARABÉNS!
ResponderExcluirNosso obrigado, Felícia Ribeiro!
ExcluirMuito dinâmico seus esclarecimentos. Parabéns!
ResponderExcluirExcelente, parabéns!
ResponderExcluirBem didático, obrigada!
ResponderExcluirQuem sabe muito, explica em detalhes...muito fácil entender assim.Excelente!
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