Diferença entre error in procedendo e error in judicando
A compreensão da matéria recursal, em todos os ramos do direito, é extremamente importante para o desempenho profissional daqueles que militam na área jurídica (Advogado, Promotor, Juiz, Defensor Público, etc).
Por meio do sistema recursal, as decisões
jurisdicionais são confirmadas ou infirmadas por, em tese, magistrados mais
experientes, ocupadores de instância superiores[1] e desprovidos de qualquer
vínculo com as partes envolvidas na lide, fato que assegura a tão necessária
imparcialidade.
Como anunciado pela doutrina, o recurso está
arraigado ao direito de ação e também o é exercido mediante a utilização do
processo. Sua criação vai ao encontro da própria natureza humana, que não se contenta com um único julgamento, ainda mais quando ele não atende a seus interesses.
Convém destacar que, em regra, a
parte apenas recorrerá no processo quando ela estiver insatisfeita[2] e irresignada com o provimento
jurisdicional que lhe fora prestado, isto é, quando a pretensão que deduziu em juízo
não tiver sido acolhida.
Nesse ponto, a parte sucumbente pode impugnar a
decisão alegando que o magistrado cometeu:
1- error in procedendo; ou
2 – error in judicando.
Esses erros são defeitos contidos nas decisões
jurisdicionais, capazes de ensejar sua reforma ou sua invalidação.
O erro in procedendo consiste no
erro do juiz ao proceder.
É um erro de forma. O magistrado inobserva os requisitos formais necessários
para a prática do ato, culminando num decisório nulo. É o exemplo da sentença
que falta relatório ou a que concede pedido que a parte autoral não postulou
(sentença extra petita).
Presente alguma das referidas hipóteses, a parte
prejudicada tem de pedir a CASSAÇÃO da sentença. Tem que pugnar por sua invalidação/anulação,
visto que o magistrado não obedeceu à forma, nem os limites de sua atuação.
Incorreu num erro improcedendo.
Destaca-se que, embora o erro in procedendo
consiste, basicamente, no vício formal contido na própria decisão proferida
pelo magistrado, tem-se que a ausência de condições da ação e de pressuposto
processual para o desenvolvimento válido e regular do processo, igualmente, é considerado
erro procedimental do juiz, que implicará na extinção prematura da lide.
Diante disso, supondo que o processo seja extinto
sem análise de mérito por ilegitimidade ativa, o autor deve na apelação pugnar
pela ANULAÇÃO da sentença e não por sua REFORMA.
Repare o seguinte julgado:
“EMENTA: AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE ÁREA -- EXTINÇÃO DO PROCESSO POR ILEGITIMIDADE ATIVA - SENTENÇA ANULADA - Nos termos do art. 212 da Lei 6.015/73, os proprietários do imóvel e o possuidor e promitente comprador possuem legitimidade para requerer judicialmente a retificação de área. (Apelação Cível 1.0177.11.001212-3/001, Relator(a): Des.(a) Luiz Artur Hilário , 9ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 22/10/2013, publicação da súmula em 29/10/2013)” (destacado)
Por outra via, salienta-se que o erro improcedendo
também pode se dar no transcurso do processo, v.g., quando o
Ministério Público não participa de feito que deveria intervir. Nesse caso,
todos os atos decisórios deverão ser anulados até o momento em que cabia
ao parquet integrar a lide, seja como parte, ou como fiscal da
lei[3].
Pontua Barbosa Moreira[4]:
“O error in procedendo implica em
vício de atividade (v.g., defeitos de estrutura formal da decisão,
julgamento que se distancia do que foi pedido pela parte, impedimento do juiz,
incompetência absoluta) e por isso se pleiteia neste caso a INVALIDAÇÃO da
decisão, averbada de ilegal, e o objeto do juízo de mérito no
recurso é o próprio julgamento proferido no grau inferior” (destacado).
De outro norte, no que atine ao erro in
judicando, este consiste no ato pelo qual o juiz se equivoca quanto
à apreciação da demanda, seja porque erra na
interpretação da lei, seja por que não adequa corretamente os fatos
ao plano abstrato da norma. O magistrado erra ao julgar.
Tal erro recai sobre o próprio conteúdo que compõe
o litígio. É erro material. Enseja a REFORMA da decisão e não sua cassação. É o exemplo da
parte que pugna, nas razões do recurso de apelação, pela diminuição do valor de
dano moral que o juiz de primeira instância a condenou.
Nesse caso, a parte requererá a reforma da sentença
por entender que o magistrado incorreu em erro in judicando. Para
ela o juiz não aplicou a lei como deveria.
No mesmo sentido, elucida Moreira:
“o error in iudicando é resultante
da má apreciação da questão de direito (v.g.,
entendeu-se aplicável norma jurídica impertinente ao caso) ou de fato (v.g.,
passou despercebido um documento, interpretou-se mal o depoimento de uma
testemunha), ou de ambas, pedindo-se em conseqüência a REFORMA da
decisão, acoimada de injusta, de forma que o objeto do juízo de
mérito no recurso identifica-se com o objeto da atividade cognitiva no grau
inferior da jurisdição” (destacado).
Frisa-se que o conhecimento das espécies de erros é
importante na medida em que sua alegação e constatação podem acarretar efeitos
distintos no processo. Pugnando o postulante, p.ex., pela cassação de uma
sentença por constatar erro in procedendo, o magistrado de segunda
instância irá tão somente anular a decisão e, posteriormente, remeter os autos
para o juízo a quo apreciar a lide outra vez (exceto no caso
do §3º do art. 515 do CPC).
Entretanto, requerendo a parte à reforma da decisão
em virtude do erro in judicando, o juízo ad quem reapreciará
a lide e verificará se a sentença proferida pelo juízo a quo está
em consonância com o entendimento daquela corte. Supondo o Tribunal que o juiz
de primeira instância errou ao dirimir o conflito, então proferirá nova decisão
que suplantará a anterior e não determinará a decida dos autos. O acordão
substituirá a sentença.
O STJ, em acórdão proferido em 2011, explica com
clareza as consequências na demanda, quando diante de error in
procedendo e error in judicando.
Vejamos:
RECURSO ESPECIAL. ARTIGO 512 DO CPC. ERROR IN
JUDICANDO. PEDIDO DE REFORMA DA DECISÃO. EFEITO SUBSTITUTIVO DOS RECURSOS.
APLICAÇÃO. ERROR IN PROCEDENDO. ANULAÇÃO DO JULGADO.
INAPLICABILIDADE DO EFEITO SUBSTITUTIVO. NECESSIDADE DE PROLAÇÃO DE NOVA
DECISÃO. 1. O efeito substitutivo previsto no
artigo 512 do CPC implica a prevalência da decisão proferida pelo órgão
superior ao julgar recurso interposto contra o decisório da instância inferior.
Somente um julgamento pode prevalecer no processo, e, por isso, o proferido
pelo órgão ad quem sobrepuja-se, substituindo a decisão recorrida
nos limites da impugnação. 2. Para que haja a substituição, é
necessário que o recurso esteja fundado em error in judicando e
tenha sido conhecido e julgado no mérito. Caso a decisão recorrida tenha
apreciado de forma equivocada os fatos ou tenha realizado interpretação
jurídica errada sobre a questão discutida, é necessária a sua reforma,
havendo a substituição do julgado recorrido pela decisão do recurso. 3.
Não se aplica o efeito substitutivo quando o recurso funda-se em error in
procedendo, com vício na atividade judicante e desrespeito às regras
processuais, pois, nesse caso, o julgado recorrido é anulado para que outro
seja proferido na instância de origem. Em casos assim, a instância recursal não
substitui, mas desconstitui a decisão acoimada de vício. 4. Recurso especial
conhecido em parte e desprovido. (REsp 963.220/BA, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE
NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 07/04/2011, DJe 15/04/2011) (destacado).
Destarte, nota-se que compreender a distinção entre
as espécies de defeitos das decisões jurisdicionais mostra-se extremamente
necessária. É certo que quanto preciso mais for o operador do direito, mais
credibilidade e respeito ele terá. O magistrado, com certeza, lerá com “outros
olhos” a petição de um advogado cuidadoso e que preza pela boa técnica
jurídica, mormente se tratando de direito adjetivo, que é o meio utilizado para
aplicar o direito material.
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[1]Exceto
quando opostos o recurso de Embargos de Declaração.
[2]Se a pretensão dos postulantes forem todas
atendidas, não há o que se falar em recurso, posto que faltará o interesse em
recorrer (pressuposto de admissibilidade subjetivo). Tal pressuposto está
atrelado a ideia de prejuízo. Se a parte não tiver prejuízo no processo, não
está autorizada a interpor recurso.
[3] Lembrando que não se declara nulidade quando
a decisão de mérito for a favor da parte a quem aproveite a esta declaração de
nulidade (§2º, art. 249, CPC). Aplicação do princípio da instrumentalidade da
forma.
[4] BARBOSA
MOREIRA, José Carlos. Comentários ao
Código de Processo Civil. V.5, 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p.
267.
O contrato já estava vencido, tendo o locador mudado em 12/03/2011, mas o locatário não quis receber as chaves, ignorando o direito potestativo do locatário. Tendo as chaves sido consignadas em Juízo, o mesmo declarou rescindido o contrato em 15/05/2012, dando margem a cobrança de aluguéis indevidos e enriquecimento sem causa. Consulto: Isto é error in judicando ou procedendo?
ResponderExcluirMe parece erro em judicando correspondendo a interpretação da norma; não vejo caracteristicas de erro in procedendo.
ExcluirNo texto anterior onde se lê "locador", leia-se "locatário"
ResponderExcluirAlex, esclareça melhor sua dúvida. Qual foi a decisão proferida, neste caso, pelo juiz?
ExcluirMinha cara!
ResponderExcluirAconselho-lhe uma dose a mais de estudos, tendo em vista algumas compreensões equivocadas acerca da distinção proposta.
Nunca confunda questão procedimental com questão processual!
Forte abraço.
Pode deixar que tomaremos esta dose sim. Aliás, sempre continuaremos a tomá-la! Quanto mais estudamos, mais percebemos que precisamos estudar.
ExcluirAgora, quanto à sua observação, cuidado. A questão procedimental a qual referimos no texto não se confunde com rito (comum: ordinário, sumário, sumaríssimo; e especial).
Mas, de qualquer forma, obrigado por nos prestigiar com seu apontamento!
Valeu!
Anonimamente deselegante e, acima de tudo, redundante, uma vez que todos precisamos continuar sempre estudando. Criticar o trabalho alheio é fácil, mas pode ser uma bela desculpara para se destilar recalques...
ResponderExcluirGostei muito do texto e em relação a esse comentário anônimo, não deve nem ser levado em consideração, pois a pessoa se esconde no anonimato para depreciar o autor(a) da matéria, não quero dizer com isso que não se possa discordar, mas acho ridículo fazer comentários sem se identificar.
ResponderExcluirPara mim, foi de grande valia, muito obrigada.
ResponderExcluirGostei muito do conteúdo!!!
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