Crimes omissivos próprios e impróprios
Dentro da matéria penal,
quando se inicia os estudos da teoria geral do delito, um, dentre tantos temas
a serem analisados, é o nexo de causalidade. Este pode ser conceituado como
sendo o elo existente entre a conduta praticada pelo agente e o resultado por
ela produzido.
Somente se pode imputar o delito ao
indivíduo que for causador de resultado lesivo a bem jurídico tutelado pela
norma penal. Por razões lógicas, não se pode atribuir crimes as pessoas que não
tiveram nenhuma relação com o fato punível. Para ser penalmente
responsabilizado, o indivíduo, de alguma maneira, tem de contribuir na
empreitada criminosa, seja prestando auxílio material, ou mesmo moral,
respondendo, neste caso, na condição de partícipe.
O nexo de causalidade,
ao lado da conduta, da tipicidade penal e do resultado, vai compor o primeiro
substrato do conceito analítico do crime, conforme já mencionamos em outros
artigos. Significa, portanto, que sua constatação é imprescindível na
configuração de determinada infração penal.
Ressalte-se que o Código
Penal Brasileiro adotou a teoria da conditio
sine qua non, considerando causa “toda ação ou omissão sem a qual o crime
não teria ocorrido” (art. 13, in fine, do
CP).
No post de hoje,
falaremos especificamente sobre a omissão a que se refere o sobredito
dispositivo. Aquela que a doutrina costuma chamar de omissão penalmente
relevante. E, ao mencionar sobre tal omissão, inevitavelmente exporemos sobre
os crimes omissivos próprios e impróprios, na medida em que é impossível dissociar
os dois assuntos.
Então, vamos que vamos!
Antes de definir quando
a conduta omissiva vai se transformar numa infração penal, cumpre informar que
as normas penais são divididas em duas espécies: normas proibitivas e
mandamentais.
Norma penal proibitiva é
aquela, como o nome sugere, vai proibir que o agente realize determinada
conduta. Assim, a pessoa precisa praticar um comportamento positivo para
infringi-la. Por exemplo, se o tipo penal diz que o cidadão que matar alguém
estará sujeito a pena de reclusão de 6 a 20 anos, tal previsão veda a ação humana
consistente em matar o outro. É, portanto, uma norma proibitiva. Logo, somente
responde por homicídio aquele que, com seu comportamento comissivo,
efetivamente, assassina alguém.
Para o direito penal sim, entretanto, o autor tem de ter
o dever de agir e analisar se, no caso concreto, podia evitar o resultado.
Estamos falando do famigerado garantidor, pessoa que tem a tarefa de zelar pela
integridade vítima, nas hipóteses elencadas no art. 13, §2º do Código Penal.
De outro norte, no que
tange a norma penal mandamental, esta pode ser compreendida como sendo a norma
que o tipo penal exigir, para consumação do delito, um comportamento omissivo. Basta
que o indivíduo se mantenha inerte e a infração penal se consumará. É o caso do crime de Omissão de Socorro,
previsto no art. 135 do CP.
Para facilitar o
entendimento, suponha-se a existência de um acidente automobilístico ultimado
na BR 365, que liga Ituiutaba/MG a Uberlândia/MG. Caso o condutor de
determinado veículo passe no local e, mesmo avistando pessoas feridas, não
preste socorro, prosseguindo na sua viagem, cometerá o crime em comento.
Note-se que o autor
deixa de fazer o que a lei lhe impõe. Pratica, portanto, uma conduta omissa e
viola uma norma mandamental, a qual, in
casu, consistirá em não prestar assistência às vítimas do acidente.
Destarte, em última
análise, depreende-se que a conduta necessária para consumar o delito vai
depender da espécie da norma penal. Sendo ela proibitiva, o tipo penal exigirá
um comportamento comissivo. Diferentemente, caso a norma seja mandamental, isso
recobrará do autor uma conduta omissiva.
Nessa senda, é possível
descobrir a lógica dos crimes omissivos próprios e impróprios, porquanto, nos
crimes omissivos próprios, o indivíduo vai contrariar norma mandamental e, por
sua vez, nos delitos omissivos impróprios, a norma penal violada é a proibitiva.
Vamos explicar.
A transgressão de norma
mandamental ocorre por inércia do agente. Ele não realiza uma obrigação a qual
estava obrigado pelo tipo penal (v.g., arts. 135, 244, 246 etc, todos, do CP).
Então se diz que o indivíduo, na hipótese de violação de norma mandamental,
pratica crime omissivo próprio.
A seu turno, crime
omissivo impróprio se configurará quando o autor, na condição de garantidor,
desrespeitar uma norma penal proibitiva. A omissão da pessoa que está na
condição de garante faz com que ela responda como se estivesse praticando uma
conduta comissiva. Por isso que o delito omissivo impróprio é também conhecido
como crime comissivo por omissão.
Um exemplo a ser citado
é o do salva-vidas. Ele, ao ser contratado, assume a obrigação de zelar pela
segurança dos banhistas, de forma a se evitar afogamentos em praias e piscinas
(art. 13, 2º, “b”, do CP)[1].
Logo, se esse profissional perceber que uma pessoa está se afogando e, podendo
evitar o resultado, por desídia se mantém inerte, sobrevindo a morte do
banhista, ele (salva-vidas) deve responder por homicídio consumado.
Se vai ser doloso ou
culposo, isso é outra história. Cabe a Autoridade Policial averiguar as
circunstâncias do caso concreto. O fato é que o garantidor, por ter o dever de
agir em razão de das situações estampadas no art. 13º, 2§º do Estatuto Penal,
responderá por sua omissão como se estivesse agido comissivamente.
Importa registrar que o
motivo que nos levou a elaborar esse pequeno texto foi justamente uma situação
de crime omissivo impróprio (ou comissivo por omissão, ou omissivo
qualificado). Recentemente, para ser mais preciso, no dia 30 de julho de 2014,
um menino de 11 (onze) anos teve de decepar o braço porque foi atacado por um tigre no Zoológico, em Cascavel, interior do Paraná (http://g1.globo.com/pr/oeste-sudoeste/noticia/2014/07/menino-atacado-por-tigre-em-zoologico-tem-o-braco-amputado.html).
Segundo informou o
portal de notícia G1, o pai levou o filho ao Zoológico e, ao que parece, não
prestou os cuidados necessários para se evitar o ataque do tigre.
Desse acontecimento,
caso seja comprovado que o pai foi
negligente ao não cuidar da segurança do filho, deixando o menor,
inadvertidamente, aproximar-se da jaula do animal, bem como se ficar atestado que
o genitor podia evitar o resultado danoso, então o pai deve responder pelo
crime de lesão corporal culposa.
A atribuição da
responsabilidade penal ao genitor emerge da obrigação relativa ao poder
familiar, disposta no art. 1.634 do CC/02. Desse modo, haverá a conjugação das
duas situações previstas no art. 13 do Código Penal, as quais autorizarão a
imputação do delito ao pai da criança. Essas situações são poder de agir (para impedir a lesão) somado ao dever de agir (decorrente do
poder familiar).
À vista disso, constatando
a negligência do homem para com sua prole, pelos motivos esposados, ele comete o delito de lesão corporal culposa.
É interessante ao
estudante de direito refletir sobre os acontecimentos do dia a dia. Fazer
juízo de enquandramento de condutas para apurar o raciocínio jurídico-penal. Isso
ajuda muito! Faz com que fixemos melhor as matérias.
Então, retomando o assunto
e para finalizar, comete crime omissivo próprio a
pessoa que o tipo penal manda agir e, mesmo tendo possibilidade de
cumprir o preceito, ela se mantém inerte. De outro lado, pratica crime omissivo
impróprio, o sujeito que o tipo penal impõe o dever de não agir e ele, efetivamente, não age. Porém, nesse caso, responderá pela infração penal por deixar de evitar um resultado o qual estava obrigado por lei (art. 13, §2º do CP).
Em suma, esses são os principais aspectos dos crimes omissivos.
[1]
Existem salva-vidas que são bombeiros militares, então, nesse caso, é a lei que
impõe a eles o dever de velar pela segurança dos banhistas e não um contrato de
trabalho (art. 144, V, CRFB/88).
De outro lado, pratica crime omissivo impróprio, o sujeito que o tipo penal impõe o dever de NÃO agir e ele, efetivamente, não age.
ResponderExcluirCreio ter havido erro de digitação nesse trecho... Deixou desfecho do texto confuso.